Que lembranças
você tem de seu pai? Que memórias você vai deixar para seu filho? (release, A
Canoa).
Quando li o release, percebi que seria uma boa oportunidade de me
resolver com meu pai e rever algumas coisas inacabadas. Mas, eu não sabia que
entraria filho e sairia mais pai do que nunca.
Entrei. O cenário eram malas, sacos com água e cadeiras ao redor.
Não. As malas eram histórias, eram passados e presentes de amigos,
familiares, histórias caladas, modificadas e adaptadas à canoa.
Entrei. Sentado, vi um senhor alto entrar. Veio cambaleando quase caiu
ao sentar, e passou toda a peça dormindo. Ah! Deu uma saudade de meu avô, o pai
de meu pai!
A peça começou. O silêncio, o filho, movimentos.
O filho estava lá, rompeu o silêncio.
Eram movimentos e movimentos precisos, e olhos e feição precisos. E voz
de homem, era o filho, mas era filho-homem esperando um pai bruto, mas um pai,
um de ida, de tantas idas e vindas, mas um pai. Na imensidão perdido, e tão aguardado.
Entre histórias, a esperança, o pai de sempre, mais ainda assim pai,
ainda assim amor, ainda assim, tanto em cada filho paciente, fantasioso,
decepcionado;
Este pai – herói e em tantas
curvas e retas vilão.
O filho sempre diálogo com o silêncio, como se fosse um diálogo, e por
muitas vezes diálogos. Conversa de silêncio, e uma palavra d’água, conversa de
silêncio, e uma palavra de passarinho, conversa de silêncio, e uma palavra de
cuscuz, café, os afazeres da casa;
A casa crescia nas histórias, as estradas longas e chuvosas, o caminhão,
a deslizar no barro molhado e aventureiro da imaginação. Era a estrada dentro
da criança, crescendo. Era um garoto num bordel entre tantas moças.
As surras, as palavras de pedras brutas, a partida. As conversas de
sempre e o pai não vinha, a terceira margem do rio, o garoto ainda garoto, mas
já um homem esperava esse homem, retornar. O homem estava lá, mas não
retornaria o homem. O homem estava lá, cresceu na criança, cresceu no garoto, o
homem estava lá.
O silêncio. O rapaz rompeu dessa
vez numa voracidade. A chaleira num palavreado esfumaçado. O rapaz esbravejava
de lado a outro e a chaleira aos berros, tensa. O rapaz de um lado a outro,
tensão nos olhares. A chaleira ainda mais intensa, nervosa, gritante. O cuscuz
no fogo, o senhor dormia o tempo todo.
Apagou o fogo no tempo da conversa. A chaleira silêncio. Olhares de
calmaria. As malas, os sacos de chuva, torneira, chuveiro, as cordas de comida
de passarinho, o cheiro, saudades de casa, mesa posta,
O silêncio preciso.
Aplausos.
Obs: o texto acima foi baseado na peça A CANOA, direção: Jacyan
Castilho, encenação: Cláudio Machado, direção musical: Jarbas Bittencourt.
Salvador –Bahia – Teatro Vila Velha – 2009.
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