quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Depois do I Ching, A Canoa.



Que lembranças você tem de seu pai? Que memórias você vai deixar para seu filho? (release, A Canoa).

Quando li o release, percebi que seria uma boa oportunidade de me resolver com meu pai e rever algumas coisas inacabadas. Mas, eu não sabia que entraria filho e sairia mais pai do que nunca.

Entrei. O cenário eram malas, sacos com água e cadeiras ao redor.
Não. As malas eram histórias, eram passados e presentes de amigos, familiares, histórias caladas, modificadas e adaptadas à canoa.

Entrei. Sentado, vi um senhor alto entrar. Veio cambaleando quase caiu ao sentar, e passou toda a peça dormindo. Ah! Deu uma saudade de meu avô, o pai de meu pai!

A peça começou. O silêncio, o filho, movimentos.

O filho estava lá, rompeu o silêncio.
Eram movimentos e movimentos precisos, e olhos e feição precisos. E voz de homem, era o filho, mas era filho-homem esperando um pai bruto, mas um pai, um de ida, de tantas idas e vindas, mas um pai. Na imensidão perdido, e tão aguardado.

Entre histórias, a esperança, o pai de sempre, mais ainda assim pai, ainda assim amor, ainda assim, tanto em cada filho paciente, fantasioso, decepcionado;
 Este pai – herói e em tantas curvas e retas vilão.

O filho sempre diálogo com o silêncio, como se fosse um diálogo, e por muitas vezes diálogos. Conversa de silêncio, e uma palavra d’água, conversa de silêncio, e uma palavra de passarinho, conversa de silêncio, e uma palavra de cuscuz, café, os afazeres da casa;

A casa crescia nas histórias, as estradas longas e chuvosas, o caminhão, a deslizar no barro molhado e aventureiro da imaginação. Era a estrada dentro da criança, crescendo. Era um garoto num bordel entre tantas moças.

As surras, as palavras de pedras brutas, a partida. As conversas de sempre e o pai não vinha, a terceira margem do rio, o garoto ainda garoto, mas já um homem esperava esse homem, retornar. O homem estava lá, mas não retornaria o homem. O homem estava lá, cresceu na criança, cresceu no garoto, o homem estava lá.

O silêncio.  O rapaz rompeu dessa vez numa voracidade. A chaleira num palavreado esfumaçado. O rapaz esbravejava de lado a outro e a chaleira aos berros, tensa. O rapaz de um lado a outro, tensão nos olhares. A chaleira ainda mais intensa, nervosa, gritante. O cuscuz no fogo, o senhor dormia o tempo todo.

Apagou o fogo no tempo da conversa. A chaleira silêncio. Olhares de calmaria. As malas, os sacos de chuva, torneira, chuveiro, as cordas de comida de passarinho, o cheiro, saudades de casa, mesa posta,

O silêncio preciso.

Aplausos.



Obs: o texto acima foi baseado na peça A CANOA, direção: Jacyan Castilho, encenação: Cláudio Machado, direção musical: Jarbas Bittencourt. Salvador –Bahia – Teatro Vila Velha – 2009.

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